terça-feira, 14 de julho de 2009

Ciência Iterativa: Experimentos no Século 21.


No fim do século XIX, para se fotografar o Rio de Janeiro - o que hoje chamamos de "vista aérea" - Marc Ferrez levava uma câmera de aproximadamente 35 kg e pesadíssimas placas de vidro, como filme. Afim de evitar o transtorno no transporte de similar "carga" se fazia necessário "acertar de primeira". O filme de rolo foi inventado, então, por George Eastman. Excelente! Mas havia algo errado, para que se trocasse o filme a câmera precisava voltar para a fábrica. Há alguns anos, o filme de 35mm - que ainda possui seus amantes hoje - fazia uma boa foto a cada 100 ou 200 tiradas, e isto não é exagero, uma luz não notada, um ângulo mal calculado, um atraso ou adiantamento de tempo, etc. Atualmente, apertar o obturador teve um custo que caiu a zero, com as digitais. Ferrez tinha de pensar e medir, calcular e observar muito antes de tirar uma foto. Hoje, o furor com que se fotografa, representa a esperança de que pelo menos uma preste. No cinema deu-se algo parecido. A filmagem era uma operação caríssima. Então, na era digital, o vídeo regravável provoca a grande tentação de se gravar horas a fio, para aproveitar minutos aperfeiçoados com o uso do computador.
No teatro, são necessários repetidos ensaios e rigor para que se torne fluida a representação todas as noites do espetáculo. No cinema, repete-se a cena até que ela fique "vível". Por tentativa e erro, acertamos! Percebe-se, tire a prova, que a cada dia que passa cresce o número de cinemas e não de teatros. Que dizer da música ao vivo? Só nos "Bailes Saudade", dublar é mais simples e menos cansativo para o "artista" uma vez que ele passou e repassou diversas vezes a melodia, rítmo e letra no estúdio; a melhor versão é transferida aos discos que podem ser regravados em centenas. Ao invés de uma busca reflexiva e rigorosa da melhor técnica e estética aceitáveis, pensamos acertar em função de uma busca reiterada de tentativa e erro - a isto chama-se iterativismo. Não pensamos muito, vamos fazendo aleatória e profusamente na esperança de que "dê em alguma coisa". É a "arte lotérica".
A prova de escolha múltipla que contrabandeia um elemento de tentativa e erro no processo de resposta. Se a alternativa C não pode ser correta, é eliminada. Abandonando-se as respostas erradas, tenta-se as que mais se aproximam da correta. Como se não fosse o suficiente, existem computadores que corrigem redações tão bem quanto humanos: dão notas sem entender o que foi escrito!
Sherry Turkle - minha prezada autora e socióloga, sobre qual trabalho teria defendido meu mestrado - mostra como os jovens transformam um jogo de computador em um processo de tentativa e erro que ignora completamente o conteúdo educativo - as ditas pesquisas escolares suplementares via rede - não se lêem as informações, não sabe e tem preguiça de ler para saber o princípio do que está sendo ensinado. São experts em procurar respostas por experimentação - não importando o significado. As lições que se pretendia ensinar embasando-se no jogo, ele afastou-se completamente delas. Nada mais faz do que imitar o computador: tentativas e erros para solução de problemas, por mais que não entenda o que está fazendo..
A propaganda e o marketing - que infestam as avenidas e ruas das cidades em grandes out doors - dirigem seu apelo a um público não visado - específicamente. A internet permite o spam sem destinatário certo, que vale a pena por ser grátis. A medicina clássica, utilizadora do "olho clínico" e a apalpação pelos médicos, que eram capazes de examinar e emitir um diagnóstico perfeito, foi também substituída pela experimentação através de uma guia com uma bateria de exames, para "ver o que aparece". Até os casamentos foram inundados pelo iterativismo. Tornou-se comum ouvir alguém de dizer: "- Ora, se~não der certo, separe!". E tenta-se novamente até que enfim se acerte.
Não que nunca houve iterativismo, mas o progresso tecnológico nunca antes experimentado pela sociedade o retirou do "meio científico" e impregnou toda a sociedade com o mesmo, em detrimento do raciocínio, o foco de atenção a concentração e elaboração intelectual. Daí perguntamos: avanço ou retrocesso? Teria que apresentar uma resposta relativa. Os problemas cresceram, sem dúvida. Por que não tentar usando a tecnologia? Cansa menos, é mais cômodo, não ter que ficar "batendo cabeça". Restará mais tempo para se dedicar a outros prazeres (família, círculo de amizades, religião - se pudermos dizê-la um prazer). Nascerão outros Mozzarts, Beethovens, Shakespeares, Machados de Assis, Camões? Para pensarem e repassarem a história de uma concepção de vida? Quisera eu ter a resposta!

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